Desconexa
Não consigo calar meu silêncio
Não dá pra gritar mais alto do que o vazio
E a minha agonia sempre foi palpável.
Estranhas contradições me perseguem
Como um beijo sem o toque
Ou uma saudade do que não existe.
Vivo assim, a espreita
De algo real, permanente
Que me cale as vozes baixas
E me faça gritar mais alto
Do que os mudos brados em minha mente.
Talvez um dia eu possa pedir
Só um pouco de silêncio
Um espaço no vazio
Um beijo nos lábios
Um pouco mais de mim
Um pouco de alguém.
Um pouco de alguém.
Por Vanessa Olivier
Crepúsculo
Não me digam como seguir
Quando o solo é quente e as solas finas
Já está à espera de um vendaval
Sem poder enxergar os trilhos desta estrada.
Não me digam o que vestir
Quando das vestes em trapos está a alma
Beleza aparente, sorriso sem mostrar os dentes
O tecido fino cobrindo a carcaça
Rotulando mil faces falsas
Sem eira, nem beira, nem poeira para esconder
As traças, as felpas, os remendos e o esvair da tinta
De um coração quebrado.
Não me digam o que dizer
Quando as horas tardam o sorriso dissimulado
E lágrimas amargas varrem as palavras
Que não encontram brecha, fendas na dor
Para atravessar o mar dos desalentos
E portarem-se eretas em posição de gala
A espera de meticulosos aplausos e estreitos sorrisos.
Não me digam quando ir
Quando as pernas já carregam o cair do dia
Céu que desabou sem culpa, noite que chegou sem lua
Olhos que buscam outro ver
Mente que desafia o tempo preciso
Presente que quer virar passado,
Passado que não quer ser futuro
Só imagens congeladas, fragmentos de culpa
Pés que flutuando no vago buscam o chão.
Não me digam o que sentir
Quando o coração já bate em dissonância
Tentando respirar o ar impuro da devassidão
Dos sonhos rasgados e assoprados para lugar nenhum
Levantando cinzas fartas da desesperança
E afrouxando os laços do amor.
Não sigo o que me dizem
O desejo é em vão
E os sentidos movem-se sozinhos
Não há muralhas, não há algemas, e não há bússolas
Meu elo é perdido, vago é meu caminho,
E meus passos se confundem em neblinas de ilusões.
Mas há ainda um corredor virgem
Onde meus passos tentam equilibrar-se
E busco sozinha as areias de meu inconsciente
Tentando cavar uma vala no destempero
Aflitos olhos já bebem um crepúsculo remoto
E não há mais dor, anestesiado coração.
Por Vanessa Olivier
Caminhos Turvos
Caminho na estrada longa
Com pedras e pedregulhos
Buracos e desvios
Caminhos turvos.
Olhos baixos, pensamentos embriagados
De fome, corroendo meu espírito
São.
No meu delírio simultâneo
Ouço vozes, alarido,
E um ganido de dor.
Imagens camufladas
Transpassadas de fúria
Risos coléricos e uma lágrima nas pálpebras de teus olhos
Profundos cristais.
Caminho na estrada longa
Débil sonho
Coberto de flores
Emana o cheiro da morte
E degusto com prazer
O mel do pecado
Que escorre dos teus lábios
Tépidos.
Desfruto zombeteira
A chama ardente de um
Vulto sádico
Que circunda meus olhos
Febriz, rubros
Da cor escarlate de meu batom.
Rogos apelos
Nos olhos veneno
De quem tudo quer
Caminhos torpes.
Por Vanessa Olivier
Ao léu
Vagam em minha mente
Que reclama a paz.
Por onde ando vejo
Furtivos olhos,
Retinas que camuflam o
Infortúnio.
Rogo às vozes internas
Um apelo que já vestiu
O manto do silêncio
Lamento mudo
Designado a peregrinar
Pelas estreitas margens
Do subconsciente.
Olho ao meu redor
Há nuvens carregadas de difusas incertezas
Emanando no ar
Todo meu desassossego.
Tenho as mãos frias
Pés descalços pisando
Em águas álgidas
De meu flagelo lacrimejante.
Espreito a porta do oásis
Estou a um passo do óbvio
Mas tenho as pernas derreadas
No chão do desterro.
Minha luta é em vão
Meus olhos cegos não podem ver
A saída.
O que me afugenta não sei
Não tem face o meu carcereiro
Não posso tocar minhas algemas
Encaro meu fado.
O quarto é escuro,
O leito é magro,
E o ar,
Facínora.
Tenho areias na garganta
Solto espasmos impetuosos
Porém, efêmeros se vão
Levando ao léu
Minha salvação.
Resfolego o vento a me cingir
Caio em teus braços
E vencida
Adormeço.
Por Vanessa Olivier
Saudade e espera
De todo e de tudo
O todo seu
O tudo que existe.
Meus olhos são espera
Do dia que se ausenta
Do amanhã que não vem
Da noite que não dura.
Meus olhos são lágrimas
Águas da chuva que brotou
E molhou o jardim do meu coração
Que agoniza, mas sente a beleza
Sabe do amor
É florescer, e morrer.
Meus olhos são estrelas
A espiar o infinito
A flutuar no vazio
Cosmo da solidão.
Meus olhos são estradas
Que passam e ficam
Que vão e que vem
E acalentam poeira
Brisa e sol
A terra fermentando suor
Saudade e espera
Lágrimas que secam e que caem
E ficam.
Por Vanessa Olivier
Sobrevivendo
Pelas cortinas transparentes do horizonte
Foi se esconder, levando silenciosos anseios
E a incerteza de haver um outro oceano
A derramar esperança, e verter às casas de folhas,
Verdes como a mata serrada,
E como aos olhos que lacrimejam dor.
É inútil o calor que grita e consome a pele,
O sol é majestoso, mas não soberano,
O corpo que respira quente é frio,
Treme calado na sua languidez minuta,
Que ainda não sabe a proporção do amanhã,
Como a poeira que se levanta arrastando pilares,
Sem estúpidos tapetes
Para esconder sujeiras acumuladas.
Mas as mãos nuas cavam a terra,
Que não germina frutos, o ventre é seco,
Terra regada com lágrimas vãs.
E entre os dedos borra o desconsolo
Calçando o tempo de fartos minutos,
Que não vê a ruga no olhar,
Nem a debilidade em molambos caminhos.
Mas avante se envereda por errantes calçadas,
Rastros do ato a aviltar o corpo,
Migalhas trocadas por vis invasões,
Sem ao certo saber o estrago,
Só a manchar a alma e a rebocar sorrisos
Por ígneas promessas.
Logo vem sirenes a molestar,
Grades de ferro a gotejar descrença,
A açoitar a serpente do porvir,
Mas a calar a fome com um prato de comida.
Eis a falência dos sonhos,
Sobreviver é tudo ...
Por Vanessa Olivier
Do abismo ... à luz
Andei a procura do abismo
Lá em baixo pude ver o
que já previa
E meus olhos se agonizaram
num mar de desilusões
Aparentemente não era
cansaço,
Uma via cruzes de
imundas emoções
A lama a cobrir os
lábios que balbuciavam
A dor, o medo, a
solidão.
Assaltou-me o desejo de
aviltar
E desmoronar paredes,
pilares de ferro
Antigas construções
Todas no salutar de
esquizofrênicos sonhos
Já ruborizados de
vergonha, véus cobrindo faces,
Mãos a rezar, a esperar,
a clamar por luz
E eu ainda com os olhos
inchados,
Tentando encontrar
rastros,
Vestígios de uma
dignidade perdida, ou camuflada
Entre intempéries,
tempestades, laços rotos, lamas pelo corpo
E nenhuma luz, nenhuma
gota de nada, só a sombra e o abismo
Entre o dia e a noite, o
amanhecer e o anoitecer, o sol e a lua
Meus olhos a dançar, meu
coração a trepidar, meu corpo a pregoar,
E tudo o que existe, de
mim, do mundo, da vida
Escorrendo como a lava
de um vulcão,
A devorar pastagens,
flores, sorrisos imaculados.
Fecho os olhos já
inflamados, afasto-me do abismo
Devagar, arrastando-me
entre pedras e capim
Esforço soberano, a pele
esfolada, o coração tentando respirar,
Os olhos tentando
avistar, um bosque florido, um lago puro, um céu azul
Mas os pulsos já
feridos, os joelhos a gritar, a força a escoar e esmorecer
O desejo perder-se pela
abatia do corpo,
E a alma em solfejos de
derradeiros suspiros.
Agora já é tudo
longínquo; o abismo, o bosque florido,
Os sublimes sonhos e os
dantescos pesadelos
Mas a luta ainda não é
finda
E os ossos parecem
reagir
As pálpebras a tremer
levantam-se
O sangue volta a bombear
o coração e a mandar estímulos à alma
O céu parece ter
descido, a terra subido, o mar coberto por pastagens,
Campos invadidos por
águas oceânicas
E meus olhos a
contemplar uma vida que se regenera.
Respiro aliviada ao
compreender
Que não mais terei eu
A buscar o abismo, ver a
lama a pulsar
Pois tudo agora é luz.
Por Vanessa Olivier
Cantos de Guerra
Pelas trincheiras
abarrotadas
Sentinelas se avizinham
alinhavadas
Nos braços fortes
carregam carabinas
E na farda esfarrapada
projetam ao longe
Os infortúnios da missão
incumbida.
Nos desfiladeiros
sinuosos jazem
Corpos varados por balas
de fogo
Envoltos por um tapete
de sangue
Esquecidos no desleixo
de um drama
Adormecidos corpos na
lama.
No alto do céu voam
andorinhas
Cantando lúgubres cantos
de guerra
Que ressoam nos ouvidos
O canto pérfido dos
canhões
Orquestra dos
espavoridos.
Pervagando tortuoso
caminho
Alarmados corações,
sentidos em guarda
Pelas trilhas rebuscadas
de tocaias
Heróicos soldados
percorriam
Levando seus temores iam
Pelas emboscadas vinham.
Nos refúgios, moribundos
aguardavam
O desfecho crucial do
pesadelo
Que
entre lamentos e invocações
Afogados
no pranto mudo
Dos
desgraçados que rogavam
Pela
vida ou pela morte
Desditosa sorte.
A sede sufoca-lhes a
garganta
Dos soldados combalidos
nas caatingas
E não renunciam a
batalha.
Soldados bravos, temidos
soldados
Que lutam até o esvair
da derradeira força
Morrem honrados, bravios
soldados.
A derrota abate o
inimigo entregue
E nas mãos triunfantes
bandeiras erguem
Nos lábios ressequidos
rasgam-lhes sorrisos
Misturados às lágrimas
da comoção
Arrebatando-lhes o
coração.
E choram o sangue dos
companheiros
E mancham o estandarte
de escarlate
A cor da valentia nas
mãos feridas
E nas vestes em trapos,
E nos olhos
lacrimejantes,
Olhos escarlates.
Os sonhos adolescentes
diluíram-se
Restando apenas fagulhas
Poeiras no vácuo
coração.
Lágrimas lúgubres
dispersam afogadas
Folha Seca
O brilho extinguiu-se
dos vivos olhos
A palidez mórbida da
face
Escondeu o bronze da
pele
E a secura impiedosa dos
lábios
Afugentou o sorriso
perolado.
Da boca álgida, o grave
timbre da voz
Perdeu-se na garganta
febril
As mãos firmes ganharam
um estranho tremor
Os músculos avantajados
e rijos
Foram envolvidos por uma
berrante atrofia
Esvaindo-se a força
combalida.
Os alvos cabelos não
dançam mais ao vento
Os sonhos adolescentes
diluíram-se
Restando apenas fagulhas
Poeiras no vácuo
coração.
Lágrimas lúgubres
dispersam afogadas
De um suplício já sem
voz
Cúmplice da euforia
Queimando a pele,
Consumindo a carne,
Embriagando a mente
nociva,
Envenenando o sangue das
veias
Obstruídas pela
entorpecente seringa.
Na solidão das ruas
sombrias
Passos trôpegos,
Vestes rotas,
Arrasta-se sem destino,
Tomba na calçada,
Deixa-se ficar lá.
O corpo esguio estirado
no chão,
Como uma folha seca,
Que dá árvore despenca
Já sem forças para no
galho se agarrar.
No peito, falta-lhe o
ar,
A pulsação agita-se,
E os poros choram suor.
Os olhos esgazeados e
absortos,
Profundas olheiras,
Sombras de um dantesco,
Perpétuo pesadelo.
Fecha os olhos
dardejantes da febre,
Na mente ébria imagens
lhe vêem
Um menino corre alegre
Repleto do regozijo da
infância
Longínquas lembranças
Remotas ilusões.
Eis o desditoso presente
Caindo nos braços do
óbito
Pelos turvos caminhos do
tóxico
E todo o resto são
cinzas.
Por Vanessa Olivier
Ilusões
No litoral ando em círculos
Ouço vozes passeando
pelas águas
Lágrimas salgadas do mar
E vejo nas nuvens seus
olhos
Fulgentes em chama a me
fitar
Onde o vento robusto
canta
Na rouquidão de seus
ruídos
A sôfrega melodia de
nossos dias
Arfante noites, júbilos
momentos
Junto a ti.
Passeio os olhos pela
multidão
Fortes semblantes onde o
sol cintilou
Não me trazem a paz
Que dorme no âmago vazio
Atrás de meu sorriso
glacial
Úmido do pranto
Contida dor.
Ando passos morosos
A areia leva-me aos pés
do pélago
E deito em seus braços
Deixando o corpo vagar.
O sol beija-me a face
molhada
Doce despedida.
Fecho os olhos cúmplices
da melancolia
E deixo ser absorvida
pelo nada
Castelos tombados
Em meu leviano coração.
Os derradeiros
pensamentos
São faíscas de um fogo
Que se apagou
E tudo o que resta
São ilusões.
Por Vanessa Olivier
Serpente da Culpa
Eu
ando sobre as águas
Do mar ébrio
Caminhos extremos,
polvilhos de sol.
Danço na luz dardejante
De seus olhos
Pedras cristalinas
A rutilar a luz da lua.
Sinto congelar-me o
sangue
Ardendo na veia
Explodindo na boca
A gotejar no chão
Terra argilosa
Fria,
Funda,
Escura,
O breu da cova úmida.
Sufoco-me com a saliva
Palavras proibidas
A doer no coração
E pesar
Na mente sã.
Tapo os ouvidos feridos
Do berro estridente
Doente,
Serpente da culpa
A espancar meus sentidos
Doridos,
Felinos do algoz pecado
O gozo do escárnio
A faiscar meus olhos
escarlates
Molhados do pranto
Sucumbido.
Enterro-me no sádico
Perverso silêncio
Rouco do penar
E olho nos olhos
Demente,
Sementes da dor.
Na verdade eu só queria
Desfazer a mentira
Que espanca meu
espírito,
Devora meus sentidos,
Esmaga minha alma,
Quando olho para ti.
Por Vanessa Olivier
Ansiedade
Pervagando caminhos estreitos
Luz que queima meus
ombros
Noite que fustiga-me a
visão.
De longe não posso ver
Toda a imensidão.
Caminho só na estrada
Levando em meus passos
Uma dor estranha
E uma brasa em meu peito
Sobressaída de leve e
trás
Olhando o vago a procura
De um olhar
De um saber
O que dizem os seus
olhos
Não sei.
Varejar um mar
desconhecido
Águas que rompem a
divisa
Queimam a pele, o sal
Brindam-me com o
frescor,
O calor, o incrédulo do
abismo
Já não vejo mais o sol
E as nuvens se
esconderam
Dentro de um céu que já
é noite.
Continuo vasculhando
Sem saber o encontro
Olhos que não vagam em
lugar nenhum
Lágrimas que arrebentam
o peito
E não se vê gotas de
nada
Só o peito ofegante
A respiração entre
sobressaltos
Ânsia de querer ver um
olhar
Perdido, à toa, sem
pressa, sem destino,
Na certeza de apenas
estar
Por perto.
Por Vanessa Olivier
VENDAVAL
Estou correndo de um vendaval
Olhos rebuscados de areia
Cabelos jogados ao léu do destino.
Tento encontrar uma saída
Paredes que me rondem
Atalho sigiloso onde eu possa sentir as mãos
Firmes no concreto.
Mas não há resguardo, tudo é vasto
Imensas estradas que levam a lugar algum
Repletas de nada, só de vento e agonia
Espanto nos olhos bêbados, poeira na garganta seca
Espasmos a aturdir a mente ofuscada
Cansaço a fragilizar os músculos trôpegos.
Ouço um ruído distante assoprado com as areias
Vozes a me rogar a perseverança
E o espírito volta a ladear-se de obstinação.
Mas, a estrada é infinita e meus olhos não
alcançam nada
Ando, corro, paro, respiro, choro, sento, deito,
fecho os olhos
E meu corpo está a deriva, rijo de frio
A poeira cobre minha respiração, mas a mente está
a navegar
Em mares contingentes.
Os pensamentos já não obedecem ao corpo,
Desvencilharam-se da dor, do medo, da agonia
E as vozes voltam para varrer as areias.
Abro os olhos e vejo a mesma estrada
O mesmo vendaval, a mesma euforia
Mas há algumas placas
Flechas a indicar novos caminhos
Um deles pode me afastar do vendaval
Mas temo errar a direção e me lançar em tormentos
piores
E já não ando mais, o medo me paralisa
E as vozes se afastaram.
Estou quase me acostumando com o vendaval
Tento pensar que a poeira não é tão ruim
E que poderei resistir a tormenta.
Mas o tempo passa e a agonia aumenta
Já não posso mais suportar
E ando em direção aos caminhos
Escolho desvairada um deles
Tento confiar nas vozes que me guiam
E que voltaram a estremecer meu espírito
Palpitar o desejo de libertar-me.
Ao entrar logo sei do erro
Uma chuva fria e intensa desaba sobre mim
A força da água atrapalha minha visão
O frio me consome, e começo a ser apedrejada pelo
céu
Fartos cubos de gelo despencam sobre minha cabeça
Só resta-me correr e procurar outro atalho
E novamente o medo e o desejo travam luta
Mas a fé vence
o medo.
Adentro em outro caminho, sinto um calor abrasante
O ar fica carregado, e a respiração se perde no
clima escaldante.
Corro para outra estrada, agora temendo e
destemendo o novo infortúnio
Sabendo que poderei encontrar outros piores
Mas sem nunca esquecer que um deles será o certo
E então não haverá mais agonia
E estarei livre.
Por Vanessa Olivier
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