O reflexo no espelho foi impiedoso
Busquei na lâmina fria uma ponta de sutileza
Na linha fina que faz sombra aos cílios longos,
No contorno preeminente às quinas dos lábios esguios,
Na saliência bugosa sob os olhos escuros.
Mas no silêncio do espanto se fez uma resposta
Assustadoramente diáfana,
O peito gorgolejando pontadas doridas,
E insensata, resfoleguei, praguejando os ponteiros
De um tempo que me escapou,
Escorregadio, apático dos meus desejos,
E deixando uma saudade vulgar, quase tola
Dos áureos dias de coração bucólico,
Uma pele tenra de quem ainda há esquinas,
Ruas, estradas, planícies, horizontes imaculados.
Mas a saudade arteira me encara no espelho,
Os olhos se arregalam, a boca se retrai em ultraje
A convicção das rugas, inusitadamente,
Pisca-me um olho, e a resposta é clara:
Seja o ontem, o hoje e o amanhã.
Saudade, pode ficar, não ligo!
Vanessa Olivier